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A ARTE DE SER AVÓ

Raquel de Queiroz

...Quarenta anos, quarenta e oito. Você sente, obscuramente, nos seus ossos, que o tempo passou mais depressa do que esperava. Não lhe incomoda envelhecer, é claro. A velhice tem suas alegrias, as sua compensações - todos dizem isso, embora você pessoalmente, ainda não as tenha descoberto - mas acredita.

Todavia, também obscuramente, também sentida nos seus ossos, às vezes lhe dá aquela nostalgia da mocidade.

Não de amores nem de paixão; a doçura da meia-idade não lhe exige essas efervescências. A saudade é de alguma coisa que você tinha e lhe fugiu sutilmente junto com a mocidade. Bracinhos de criança no seu pescoço. Choro de criança. O tumulto da presença infantil ao seu redor. Meu Deus, para onde foram as suas crianças? Naqueles adultos cheios de problemas, que hoje são seus filhos, que têm sogro e sogra, cônjuge, emprego, apartamento e prestações, você não encontra de modo algum as suas crianças perdidas. São homens e mulheres - não são mais aqueles que você recorda.

E então, um belo dia, sem que lhe fosse imposta nenhuma das agonias da gestação ou do parto, o doutor lhe põe nos braços um menino. Completamente grátis - nisso é que está a maravilha. Sem dores, sem choro, aquela criancinha da sua raça, da qual você morria de saudades, símbolo ou penhor da mocidade perdida. Pois aquela criancinha, longe de ser um estranho, é um menino que se lhe é "devolvido". E o espantoso é que todos lhe reconhecem o seu direito sobre ele, ou pelo menos o seu direito de o amar com extravagância; ao contrário, causaria escândalo ou decepção, se você não o acolhesse imediatamente com todo aquele amor que há anos se acumulava, desdenhado, no seu coração.

Sim, tenho a certeza de que a vida nos dá os netos para nos compensar de todas as mutilações trazidas pela velhice. São amores novos, profundos e felizes, que vêm ocupar aquele lugar vazio, nostálgico, deixado pelos arroubos juvenis...

quarta-feira, 4 de maio de 2011

RESENHA 2 – TEORIAS CRÍTICAS

Dados da Obra
Autor: Tomaz Tadeu da Silva
Título: Documentos de Identidade – Uma introdução as Teorias do Currículo
Capítulo: Códigos e Reprodução Cultural: Basil Bernstein
Editora: Autêntica, 2003 – B. Horizonte

1- Idéias Principais / Argumentos Fundamentais.

            Para Bernstein o conhecimento educacional está interligado pelo que ele chama de três sistemas de mensagem: o currículo que define o conhecimento básico, a pedagogia que estrutura a forma como transmitir, organizar e sistematizar o conteúdo e a avaliação que estrutura os critérios pelos quais se pode dizer se o estudante aprendeu ou não.
           
            Na teorização de Bernstein observa-se que é através da estrutura do currículo e da pedagogia que se aprendem os códigos de classe.

            A questão crucial para Bernstein é: como se aprendem posições de classe?
Através do código. Que é um conjunto de regras implícitas. Pois é  o código que faz a ligação entre as estruturas macrossociológicas da classe social, a consciência individual e as interações sociais do nível microssociológico.

            Nessa linha de pensamento, Bernstein distingue o código elaborado e o código restrito onde os significados realizados pela pessoa são relativamente independentes do contexto local no código elaborado e no código restrito o “texto” produzido na interação social e fortemente dependente do contexto. Bernstein não hierarquisa esses códigos, pois trata-se simplesmente de códigos culturais diferentes.

            Na perspectiva de Bernstein aprende-se o código em diversas instâncias sociais, vivendo as estruturas sociais, como família e escola, sendo que na escola essas estruturas se expressam através do currículo, da pedagogia e da avaliação.

2- Idéias Secundárias / Alguns Detalhamentos

            Bernstein se preocupa com as relações estruturais entre os diferentes tipos de conhecimento que constituem o currículo e como essa organização do currículo está ligado a princípios diferentes de poder e controle.

            Na sua distinção entre currículo tipo coleção e o currículo integrado ele conclui que as áreas e os campos de conhecimento podem ser mantidos fortemente isolados, separados ou muito menos nítidos, muito menos marcados respectivamente.

            Bernstein usa o termo “classificação” para se referir ao maior ou menor grau de isolamento e separação entre as diversas áreas do conhecimento, com isso ele denomina de fortemente “classificado” um currículo do tipo tradicional e fracamente “classificado” um currículo interdisciplinar.

            Outro termo usado por Bernstein é o “enquadramento” que é usado para designar o processo de transmissão, podendo dizer que o ensino tradicional tem um “forte” enquadramento, enquanto que o ensino centrado no aluno é fracamente “enquadrado”.

3- Apreciação Crítica

            O capítulo escrito por Tomaz Tadeu da Silva é baseado na teorização de Basil Bernstein e tem como objetivo mostrar que é impossível compreender o currículo sem uma perspectiva sociológica, pois uma teorização crítica da educação não pode deixar de se perguntar qual  é o papel da escola no processo de reprodução cultural e social.

            O texto é direcionado a profissionais que atuam nas diversas áreas da educação e tem como proposta levar o educador a refletir que é através da estrutura do currículo e da pedagogia que se aprende os códigos de classe.

            O autor tenta dar uma roupagem mais clarificada a teorização de Bernstein que usa uma linguagem complexa e relativamente obscura.

            Trata-se de um livro de muita relevância na medida em que sugere ao leitor professor ou pesquisador da educação uma reflexão a cerca do que vem a ser currículo a partir de posicionamentos de vários autores.

Ângela Maria Azevedo Morais

4 comentários:

  1. "...podendo dizer que o ensino tradicional tem um “forte” enquadramento, enquanto que o ensino centrado no aluno é fracamente “enquadrado”."

    Ângela, como poderíamos iniciar uma descrição de um "curriculo centrado no aluno"?

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  2. Paulo
    Poderíamos iniciar uma descrição de um currículo centrado no aluno usando a explicação de Benstein.
    Benstein insiste que não se pode separar questões de currículo de questões de pedagogia e avaliação.
    Ele exemplifica que numa sala de aula tradicional é o professor que decide o que ensinar, quando ensinar, em que ritmo ensinar; decide os critérios de avaliação e assim quanto maior for o controle do processo de transmissão do professor maior é o “enquadramento”, afirmando que o ensino tradicional tem um forte enquadramento, o mesmo não acontece numa sala de aula construtivista, pois aí a organização do espaço é mais livre o aluno tem um grau muito maior de controle sobre o tempo e o ritmo da aprendizagem, assim uma sala de aula centrada no aluno é fracamente enquadrada.

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  3. Pergunta pertinente e resposta bem fundamentada no texto lido. Adequadamente discutido.Muito bom!!!

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  4. A questão crucial para Bernstein é :como se aprendem as posições de classe?alguém pode me explicar isso por favor

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